Se Pepeu Gomes lá pelos idos de 1980 e pouco já cantava “Ser um homem feminino, não fere meu lado masculino”, obviamente discussões de gênero não são exatamente uma novidade, ainda mais no mundo da moda.
Os smokings do estilista Yves Saint Laurent, a androginia da modelo Twiggy, os kilts do stylist Marc Jacobs, enfim, uma longa lista de rostos e de roupas genderless já dava pinta em décadas passadas, muito antes do termo existir.
Mas talvez a grande novidade da SPFW N43 tenha sido que, pela primeira vez por aqui, os looks masculinos brilharam de igual pra igual com os femininos, tanto no street style, quanto nas passarelas.
Pelos corredores, uma profusão de saias masculinas incrivelmente bem cortadas, cabelos arrojados e um apurado senso de styling me fizeram ficar com vontade de literalmente sair vestida de menino.
A beleza dos desfiles seguiu a mesma linha: boys incríveis, com pele e cabelo que eu usaria, e meninas muito estilosas com cabelo inspirado no universo masculino, com corte pixie, topete e modelagem à base de ceras e pomadas.
Aliás, a boa mistura entre gêneros inspirou uma beleza mais natural, que propunha um respeito ao que cada modelo tinha de melhor, reforçando os traços e o gingado das madeixas em vez de impor algo que não estava lá.
Um exemplo lindo foi o que o cabeleireiro e maquiador Helder Rodrigues fez para a Cotton Project: balms multiuso coloriram bocas, bochechas e pálpebras com um quê de solzinho de outono, enquanto os cabelos fluíam livres, fossem lisos, cacheados ou crespos, tanto nas meninas, quanto nos meninos.
A Osklen também apostou numa beleza queimada de frio, com cabelos empastados e desalinhados, que não fazia a menor distinção entre gêneros pra eles e elas. Os looks traziam formas aconchegantes, alongadas e sem nenhuma limitação de gênero.
Alexandre Herchcovitch revisitou alguns modelos icônicos da sua carreira no desfile da A La Garçonne, com um mix entre grunge, fetiche e o universo do boxe. Autoral e desejável, o desfile também não fazia distinção entre meninos e meninas. Eu, aliás, queria mesmo essa calça de couro da foto um pouco abaixo, com pegada de sportwear. Ou a saia plissada usada com esse jogo incrível de proporções e comprimentos, obra do stylist Mauricio Ianes, parceiro de longa data de Alexandre nas passarelas.
O universo circense serviu de ponto de partida pro desfile da Amapô, com seu denim de formas arredondas, à la Balenciaga. Nem precisa dizer: aqui genderless também era a palavra da vez.
Até mesmo nas passarelas de moda praia, como a do Amir Slama, ou de essência fundamentalmente girlie, como a Sissa, belezas suaves, com peles naturais e madeixas unissex foram a bola da vez.
E já que o Beauty Editor é terra de beleza, não podia deixar passar a mais bela entre belas. Marcelia Freesz, top das antigas, das minhas preferidas, que sempre ostentou uma vasta cabeleira, apareceu com seu novo corte pixie, simplesmente tudo que eu queria ser quando crescer.
Pelo visto, no próximo inverno, eu, que já amo comprar roupa na seção dos meninos, vou adotar de vez o estilo deles.
Fotos: divulgação SPFW (Agência Fotosite)