Ex-consulesa da França em São Paulo, empresária, jornalista, autora de livros, consultora de empresas. O currículo parece extenso para uma mulher tão jovem como Alexandra Loras, que aos 40 anos acumula experiências nas áreas da diplomacia e do empoderamento feminino.

Figura conhecida na elite paulistana, a francesa se destaca por ser uma mulher negra em um ambiente social majoritariamente branco. Mas não pense que esse detalhe a intimida: Alexandra faz questão de falar sobre o tema em entrevistas, trabalha com a elevação da autoestima da população negra feminina e, para completar, vivenciou uma transição capilar, assumindo o cabelo crespo. É exemplo de beleza e de atitude!

Eu, como colaboradora que fala sobre a beleza negra aqui no BE, tive o privilégio de conversar com essa mulher inspiradora e descobrir qual a sua relação com a beauté – desde o viés político até os truquezinhos que todas temos (por que não?). Um spoiler: a simplicidade faz a cabeça da moça!

VANESSA VENTURA: A preocupação com a beleza sempre esteve presente na sua vida?

ALEXANDRA LORAS: Sim. Como mulheres, somos formatadas desde a infância, através de desenhos animados, publicidades e novelas, a desenvolver muito a coisa da “beleza”. A estilista Coco Chanel disse uma vez: “Não existem mulheres feias, só preguiçosas”. Mas a verdade é que cada mulher tem uma beleza que vem de dentro para fora, dependendo da sua autoestima.

VV: No Brasil, muitas meninas negras têm dificuldade de reconhecer e cuidar da própria beleza porque são ligadas ao padrão físico europeu. Você também viveu isso?

AL: Hoje sinto que o empoderamento das mulheres está muito forte e isso faz com que elas escolham outros caminhos de beleza, muito diferentes dos que existiam quando eu cresci: a ditadura do alisamento, por exemplo. Hoje, estamos assumindo nossos cabelos crespos como ato político. Nossa ancestralidade, nosso “corpão”, que são diferentes da estética caucasiana, europeia. No Brasil, o colorismo é muito complexo: existem diversas mulheres que, na Europa ou nos Estados Unidos, seriam consideradas negras, mas aqui não se reconhecem como tal. Há uma negação, uma inferiorização dos afrodescendentes – o Brasil não assume os seus 54% de negros que tem (segundo uma fonte oficial, o IBGE). O sistema, não só o institucional, mas a própria mídia, é muito racista com sua falta de representatividade, achando que, colocando umas gotinhas de diversidade, ela resolve o problema. Não são permitidos negros em papeis de protagonismo. Isso gera uma autoestima baixa nas crianças.

VV: Saindo da questão política e falando um pouco sobre as diferenças de cultura: morar no Brasil influenciou de alguma forma seus hábitos de beauté?

AL: Sim! Me inscrevi num grupo fechado do Facebook, o Cacheadas em Transição, onde meninas contam o desafio de voltar aos fios naturais. Eu ainda estou na transição e, durante um ano, batalhei comigo mesma para não alisar de volta. Tive que lutar contra os padrões que trazia da França. Quando parei, não me achava linda, mas assumir meus cachos, meu cabelo crespo, foi um ato político. Usei extensão e alisei por mais de 30 anos, então é muito difícil viver essa transição. Mas agora estou começando a gostar da minha identidade, a agradecer e assumir a minha beleza natural. Por isso, é muito importante nos juntarmos e nos empoderarmos.

VV: Como foi o processo de passar por uma transição capilar, principalmente fazendo parte da classe alta, onde esse processo ainda não foi tão disseminado?

AL: Sou praticamente a única negra na elite (risos), então nos eventos sou sempre a diferente. Hoje, meu cabelo crespo vira hype, cool, fashion. Mas fui palestrar no shopping Village Mall para a marca Amsterdam Sauer, sobre diversidade, e depois uma mulher que assistiu à conversa veio me falar: “nossa, gostei de sua palestra, você é tão linda, mas seria ainda mais linda se alisasse o cabelo”. Eu pensei, my God, depois de eu falar quase uma hora sobre diversidade, ela quis me encaixar de novo (risos). Mas pelo menos essa mulher teve coragem de falar. Acho que a maior parte da elite gostaria de ver meu cabelo alisado de novo. Só que, para o trabalho que eu faço, é essencial ficar crespa para incentivar outras meninas a assumirem quem elas são.

É claro que não quero ficar na ditadura do cabelo crespo, tampouco – porque está se formando uma, já percebeu? Mas acho bom passarmos pela transição capilar para depois, comparando os looks, poder escolher o que mais gostamos. Se uma mulher se sente mais linda com cabelo alisado, tudo bem. Eu, inclusive, posso entender meninas que ainda não assumiram seus cabelos naturais porque ainda estão num processo de se empoderar intelectualmente, economicamente… É um processo longo. Hoje acho bem mais fácil, na posição em que ocupo, usar meu cabelo crespo. Durante minha evolução social, não era tão simples assim. Por isso, não posso julgar quem faz a escolha de alisar considerando que isso pode ajudá-la, por exemplo, a conseguir o trabalho que almeja.

VV: Hoje, você é adepta de alguns produtinhos naturais, como o óleo de coco. Mas e os cosméticos franceses, tem alguns preferidos para pele negra e cabelo afro?

AL: Realmente uso muitos produtos de beleza naturais! Utilizo gel de linhaça, que deixa os cachos lindos, junto com óleo de coco, de rícino e outros. Misturo água, óleo de coco e outros óleos naturais em um borrifador e aplico nos cabelos. Uso também muitos produtos da Phyto Paris, meus franceses preferidos, e da brasileira Salon Line. Sou bem eclética nas minhas escolhas!

Fotos: Marcus Steinmeyer/divulgação

Autora

Cacheada assumida e apaixonada por novidades de skincare e de maquiagem, eu vivo a paixão pela beleza desde criança, quando adorava passar creme anti-idade escondido. Além de blogueira de beleza (já conhece o Belícia?), sou formada em RP e pós-graduada em Gestão de Marcas, o que me fez desenvolver um olhar atento para o comportamento das empresas diante de seus consumidores. Será que as marcas já sabem lidar com as mulheres negras e com cabelo afro? No Blog das Convidadas, minha missão é mergulhar fundo nos lançamentos nacionais e internacionais e contar para você o que há de bacana para o nosso segmento. Chega de sofrer para encontrar a base certa ou o creme milagroso!

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